Entrevista com Marcos Dantas, pesquisador indicado ao CGI.br
Inicia hoje (18) a votação para a nova composição do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). As eleições dos membros ocorrem a partir dos votos de um colégio eleitoral, composto por entidades representativas de cada segmento (Comunidade Científica e Tecnológica, Empresarial e Terceiro Setor). Pela terceira vez, a Ulepicc-Brasil indicou um candidato para a representação científica e tecnológica, o ex-presidente da entidade Marcos Dantas.
Dantas é Professor Titular da Escola de Comunicação da UFRJ. Formado em Comunicação Social, com mestrado em Ciência da Informação (IBICT/ECO-UFRJ) e doutorado em Engenharia da Produção (COPPE-UFRJ), é professor e pesquisador do Programa de Pós Graduação em Comunicação e Cultura da ECO (PPGCOM/ECO) e do Programa de Pós Graduação em Ciência da Informação do IBICT/ECO (PPGCI/IBICT-ECO). Seu campo de ensino e pesquisa é a Economia Política da Informação, Comunicação e Cultura, com ênfase em internet, relação entre os meios de comunicação e acumulação capitalista, e políticas regulatórias. Foi membro do CGI.br nos dois últimos triênios, representando a Comunidade Científica e Tecnológica.
O pesquisador respondeu algumas perguntas sobre os desafios da participação do CGI.br e como se dará o diálogo entre os representantes do setor com as entidades de pesquisa. A votação ocorre de hoje (22) até o dia 25, com a divulgação dos votos ainda no dia 25. A divulgação da lista definitiva dos candidatos eleitos a compor o CGI ocorrerá no dia 28 (sem recursos) e 01/06 (se houver recursos). Para mais informações sobre o processo e o Comitê: https://ulepicc.org.br/ulepicc-brasil-cgibr/
Ulepicc-Brasil – Você está se candidatando ao terceiro mandato como representante da comunidade acadêmica no CGI.br. Se é possível resumir, quais os principais desafios enfrentados nesse período?
Marcos Dantas – A natureza multissetorial do CGI exige que os processos decisórios sejam conduzidos com muita diplomacia na busca da construção de consensos. Quase nada é levado a votação, considerando os muitos interesses ali representados. Esse em si já seria, e é, um grande e permanente desafio: defender posições mas, ao mesmo tempo, buscar o, e contribuir para o consenso. Deste ponto de vista, precisamos distinguir, nestes últimos 6 anos, dois períodos: antes e depois do impedimento da presidente Dilma Rousseff. O “modus operandi” do CGI com certeza mudou, sobretudo no que se refere ao relacionamento entre os representantes do governo e a bancada não-governamental. Como seguiram-se governos pouco abertos ao contraditório e, cada vez mais, menos dispostos ao diálogo com a sociedade (sobretudo o atual), introduziram-se novos fatores de tensão nas nossas reuniões, tornando ainda mais difícil os processos de construção de consensos.
Ainda neste sentido, qual o balanço que você faz, especificamente, da atuação da Comunidade Científica e Tecnológica no Comitê nos últimos anos?
Penso que, no cenário descrito, dado que o maior foco de tensões estaria situado, digamos “naturalmente”, nas relações entre o governo e o chamado “terceiro setor”, a Academia, com sua autoridade e respeito acadêmico, pode ter ajudado a encontrar soluções e avançar definições em momentos mais acirrados. E não me refiro a mim, particularmente, mas também à atuação ponderada mas firme, quando o momento exigia, dos meus colegas Sergio Amadeu e José Luiz Ribeiro.
Quais os temas que a representação da Comunidade Científica e Tecnológica deverá atuar no próximo triênio? É possível falar de uma agenda que precisa ser implementada?
Será difícil fugir dos temas pautados pela própria dinâmica da sociedade: liberdade de expressão, privacidade, proteção de dados, vigilância etc. Um tema que vai crescer é o controle, se possível, da desinformação maciçamente veiculada pelas redes sociais. É um assunto de muito difícil resolução, a exigir ainda bastante estudo para que possamos encontrar algum correto meio termo entre o controle e a liberdade. Do meu ponto de vista, como pesquisador na área, acho que deveríamos também avançar uma profunda discussão sobre o poder político-econômico das grandes “praças de mercado”, seja Facebook, seja Amazon, seja Uber, seja sobretudo Google, além outras. É uma discussão que tento pautar, sempre que surge oportunidade. Mas reconheço que a tomada de consciência nessa frente ainda é muito elementar, inclusive nos movimentos militantes que parecem naturalizar esse domínio monopolístico da internet por grandes corporações controladas pelo capital financeiro.
Para além da participação no espaço, no que pode melhorar, na sua avaliação, quanto ao contato com as entidades acadêmicas para que o acompanhamento do que é discutido e encaminhado no CGI.br possa ocorrer de forma mais fluida também entre elas e suas associadas/associados?
Ótima pergunta! Eu realmente gostaria que as nossas entidades acompanhassem mais de perto a nossa atuação no CGI, assim como fazem algumas entidades do “terceiro setor”. Para começar, todas as nossas reuniões são registradas em atas públicas bem detalhadas, sendo pois possível, por essas atas, conhecer as intervenções e posicionamentos de cada um de nós, logo manifestar concordâncias e discordâncias, assim melhor orientando o trabalho de representação. Algumas vezes, em situações que me pareceram muito sérias, tentei manter as nossas entidades informadas. Confesso que a “taxa de resposta” foi muito baixa, desestimulante… Se pudéssemos ter um fórum periódico para debater a agenda do CGI ou mesmo alguns grandes temas que hoje em dia pautam as discussões sobre a internet, eu consideraria muito positivo. Considerando o cenário geral do Brasil e do mundo neste momento, nos próximos meses e, talvez, ainda durante um bom tempo, não vejo como o CGI possa ficar à margem do que deve vir por aí. Vamos precisar de uma boa retaguarda.